Prescrição Do FGTS Prazo, Aplicação, Súmula 362 Do TST, Fiscalização, Reclamatória

1. Introdução
O fundo de garantia por tempo de serviço (fgts) é um direito resguardado a todos os empregados, conforme dispõe o artigo 7º, inciso III da constituição federal (CF/88) e a lei nº 8.036/90.
Contudo, por diversas razões, alguns empregadores acabam deixando de recolher essa importância aos empregados, ficando em débito com o empregado, bem como com a caixa econômica federal e o ministério do trabalho.
Desse modo, para exigir o efetivo pagamento dos valores devidos, tanto o trabalhador quanto os órgãos competentes devem observar o prazo prescricional, sob a pena de não poder mais exigi-lo, como será visto adiante.

2. Prescrição trabalhista
A prescrição é o instituto do direito que restringe o período de exigência de um determinado direito ou valor, pois, caso o interessado não adote os meios de cobrança de seu direito ou valor, o devedor não poderá ser cobrado.
Assim, a prescrição possui o seguinte conceito, segundo o doutrinador Mauricio Godinho Delgado, em sua obra “curso de direito do trabalho” (2019):
A prescrição extintiva constrói-se sob a perspectiva do titular do direito atingido. Conceitua-se, na linha teórica expressa no art. 189 do código civil de 2002, como a extinção da pretensão correspondente a certo direito violado em decorrência de o titular não a ter exercitado no prazo legalmente estabelecido. Também se conceitua como a perda da ação (no sentido material) de um direito em virtude do esgotamento do prazo para seu exercício. Ou: a perda da exigibilidade judicial de um direito em consequência de não ter sido exigido pelo credor ao devedor durante certo lapso de tempo.
2.1. Prazo para mover ação trabalhista
Nos termos do artigo 7º, inciso XXIX da CF/88, os trabalhadores urbanos e rurais podem mover ação judicial para o reconhecimento de créditos resultantes das relações de trabalho, no prazo de até dois anos após a extinção contratual, e, nesta ação, podem ser cobrados os valores e direitos devidos dos últimos cinco anos do contrato de trabalho.
No mesmo sentido, a reforma trabalhista (lei nº 13.467/2017) reiterou no artigo 11 da CLT a mesma previsão acima quanto ao prazo prescricional.
Assim, o empregado possui o prazo máximo para entrar com o processo judicial de até dois anos após o término do contrato de trabalho, e poderá ser solicitado o pagamento de valores devidos referentes aos últimos cinco anos do contrato de trabalho.
É importante ressaltar que esse prazo não se aplica para ações declaratórias, sem exigências de valores.
2.2. Prazo para cobrar fgts em atraso
O prazo para a cobrança em ação trabalhista dos valores devidos de fgts não pagos possui o mesmo prazo da ação trabalhista descrito no subtópico anterior para contratos de trabalho formalizados a partir de novembro de 2014.
Desse modo, existe o prazo de dois anos para mover a ação e poderão ser exigidos os últimos cinco anos do contrato de trabalho (súmula 362, inciso i do tST).
Nesse sentido, existe a súmula 206 do TST, que define o seguinte:
Sum – 206 fgts. Incidência sobre parcelas prescritas (nova redação) – res. 121/2003, dj 19, 20 e 21.11.2003 prescrição da pretensão relativa às parcelas remuneratórias alcança o respectivo recolhimento da contribuição para o fgts. Histórico: redação original – res. 12/1985, DJ 11, 12 e 15.07.1985 n° 206 fgts. Incidência sobre parcelas prescritas a prescrição bienal relativa às parcelas remuneratórias alcança o respectivo recolhimento da contribuição para o fgts.
Contudo, como será exposto adiante, existem prazos diferentes, aplicáveis de acordo com a data em que foi formalizado o contrato de trabalho.

3. Súmula 362 do TST
A súmula 362 do TST passou por uma revisão, após a decisão proferida na ação de recurso extraordinário 709212/DF, para se adequar à interpretação do supremo tribunal federal (STF) e observar a aplicação do prazo prescricional de cinco anos, conforme as explicações abaixo.
3.1. Contratos formalizados após 13 de novembro de 2014
Quando o contrato de trabalho for formalizado após 13 de novembro de 2014, o empregado poderá exigir o pagamento correto do fgts não efetuado nos últimos cinco anos do contrato de trabalho, mas o empregado deverá mover a ação judicial em até dois anos após o contrato de trabalho ter sido rescindido.

É importante observar que a súmula 362 do TST utiliza como prazo inicial da contagem do prazo o termo “ciência da lesão”. Contudo, não há definição expressa acerca do que seria ciência da lesão.
Existem decisões judiciais que consideram que a ciência da lesão corresponde ao não cumprimento do prazo de pagamento do fgts, ou seja, até o dia sete do mês subsequente (artigo 15 da lei nº 8.036/90), iniciando-se o prazo a partir do dia seguinte.
Exemplo:
Empregado admitido em 1º de fevereiro de 2017 teve o seu contrato de trabalho rescindido em 1º de setembro de 2023. Após o desligamento, o empregado percebeu que não possuía valores de fgts depositados.
Assim, esse empregado tem dois anos para mover a ação judicial, a partir do desligamento (setembro/2023).
Contudo, não pode solicitar o pagamento de todos os valores devidos desde a admissão, pois só poderá solicitar o pagamento dos últimos cinco anos do contrato de trabalho, ou seja, desde setembro/2018.
Portanto, o pagamento referente ao período de fevereiro/2017 a agosto/2018 não pode ser exigido, pois já prescreveu.
3.2. Contratos formalizados antes de 13 de novembro de 2014
Nos casos em que o contrato de trabalho foi formalizado antes de 13 de novembro de 2014, existem dois prazos que poderão ser aplicados: 30 anos ou 5 anos, contados a partir de 13 de novembro de 2014, sempre observando o fato que ocorrer primeiro.
O objetivo dessa “modulação” dos efeitos da decisão é para não prejudicar os prazos já em curso, ou seja, os contratos de trabalho já formalizados e as ações judiciais já movidas.
Cumpre informar que o dia 13 de novembro de 2014 foi a data do julgamento da are 709212/DF (tema 608).

Para realizar essa análise, são observadas as seguintes datas
1 contratos de trabalho com data de admissão até 13 de novembro de 1989 a prescrição é trintenária, pois os 30 anos finalizam até 13 de novembro de 2019, data em que se completam os 5 anos do julgamento da are 709212/df (tema 608).
2 contratos de trabalho formalizados entre 13 de novembro de 1989 e 13 de novembro de 2014 para ter direito aos valores de fgts de todo o período do vínculo (prescrição de 30 anos), o empregado teria até 13 de novembro de 2019 para ingressar com a ação.
3 contratos de trabalho formalizados entre 13 de novembro de 1989 e 13 de novembro de 2014 caso o empregado continue trabalhando e a ação seja movida após 13 de novembro de 2019, a prescrição será a de 5 anos.
Em todos os casos, deve-se observar o prazo de dois anos após a rescisão do contrato de trabalho para ajuizamento da reclamatória, podendo requerer os depósitos dos 5 anos de contrato de trabalho ou 30 anos, conforme o caso acima.

3.3. Histórico
A título de conhecimento, seguem as redações da súmula 362 do TST:
Redação original
(resolução nº 90/1999, DJ 3, 6 e 8 de setembro de 1999)
Redação anterior
(resolução nº 121/2003, DJ 19, 20 e 21 de novembro de 2003)
Nova redação
(resolução nº 198/2015, republicada em razão de erro material – DEJT divulgado em 12, 15 e 16 de junho de 2015)
Fgts. Prescrição
extinto o contrato de trabalho, é de dois anos o prazo prescricional para reclamar em juízo o não-recolhimento da contribuição do fundo de garantia do tempo de serviço.
Fgts. Prescrição

É trintenária a prescrição do direito de reclamar contra o não-recolhimento da contribuição para o fgts, observado o prazo de 2 (dois) anos após o término do contrato de trabalho.
Fgts. Prescrição
i – para os casos em que a ciência da lesão ocorreu a partir de 13.11.2014, é quinquenal a prescrição do direito de reclamar contra o não-recolhimento de contribuição para o fgts, observado o prazo de dois anos após o término do contrato;
Ii – para os casos em que o prazo prescricional já estava em curso em 13.11.2014, aplica-se o prazo prescricional que se consumar primeiro: trinta anos, contados do termo inicial, ou cinco anos, a partir de 13.11.2014 (stf-are-709212/DF).
Assim, o prazo de 30 anos foi reconhecido como inconstitucional pelo STF no julgamento da are 709212/DF, o que implicou a alteração da súmula 362 do TST, como indicado acima.
4. Prazo prescricional de 30 anos – inconstitucionalidade
Até o julgamento da are 709212 (tema 608) pelo STF, a legislação reconhecia o prazo prescricional do fgts de 30 anos, como estava disposto no artigo 55 do decreto nº 99.684/90 e no artigo 23, § 5° da lei nº 8.036/90 (redação original).
Além da redação da súmula 362 do TST, essa mesma previsão ainda está disposta na súmula nº 210 do STJ:
Súmula n° 210: a ação de cobrança das contribuições para o fgts prescreve em trinta (30) anos.
Contudo, o STF declarou a inconstitucionalidade do artigo 23, § 5° da lei nº 8.036/90 (redação original) em sua parte final para adequar as interpretações jurisprudenciais e a legislação infraconstitucional ao prazo previsto na CF/88. Para melhor interpretação sobre o tema, segue decisão publicada na ata de julgamento da are 709212 (tema 608):
O tribunal, decidindo o tema 608 da repercussão geral, por maioria, negou provimento ao recurso, vencido o ministro Marco Aurélio que o provia parcialmente. Também por maioria declarou a inconstitucionalidade do art. 23, § 5º, da lei nº 8.036/1990, e do art. 55 do decreto nº 99.684/1990, na parte em que ressalvam o “privilégio do fgts à prescrição trintenária”, haja vista violarem o disposto no art. 7º, XXIX, da carta de 1988, vencidos os ministros Teori Zavascki e rosa weber, que mantinham a jurisprudência da corte. Quanto à modulação, o tribunal, por maioria, atribuiu à decisão efeitos ex nunc, vencido o ministro Marco Aurélio, que não modulava os efeitos. Tudo nos termos do voto do relator. Presidiu o julgamento o ministro Ricardo Lewandowski. Plenário, 13.11.2014.
Assim sendo, o STF entendeu que a regra da prescrição de 30 anos não estava de acordo com a CF/88, por se tratar de um valor/direito devido, decorrente do vínculo de emprego, pois o artigo 7º, inciso XXIX da CF/88 indica que a prescrição, nesse caso, deve ser de 5 anos.
Salienta-se que, após essa decisão, também houve alteração da redação do artigo 23, § 5° da lei nº 8.036/90, por meio da lei nº 13.932/2019 (dou de 12 de dezembro de 2019), que atualmente dispõe o seguinte:
Art. 23. Compete ao ministério do trabalho e previdência a verificação do cumprimento do disposto nesta lei, especialmente quanto à apuração dos débitos e das infrações praticadas pelos empregadores ou tomadores de serviço, que serão notificados para efetuar e comprovar os depósitos correspondentes e cumprir as demais determinações legais.
[…]
§ 5° o processo de fiscalização, de autuação e de imposição de multas reger-se-á pelo disposto no título VII da CLT
Por fim, dentro do título VII da CLT, que trata do processo de multas administrativas, não há qualquer menção de prazo prescricional de fiscalização de valores de fgts pelo ministério do trabalho.
5. Prazo em fiscalização – manuais da caixa econômica federal
Como indicado acima, no título vii da CLT, não há menção de prazo prescricional de fiscalização de valores de fgts pelo ministério do trabalho.
Desse modo, ainda existem interpretações de que o prazo de prescrição do fgts é de 30 anos.
Nesses termos, o fgts – manual de orientações – recolhimentos mensais e rescisórios ao fgts e das contribuições sociais – vigência 12.07.2023 orienta em inúmeros itens o prazo de guarda de documentos por 30 anos para fins de fiscalização:
4.1.3.1.4 para fins de fiscalização o empregador mantém em arquivo, pelo prazo legal de 30 anos, os seguintes documentos:
Protocolo de envio de arquivos SEFIP gerado pelo conectividade social ICP v2;
Comprovante de quitação da guia de recolhimento; e
Arquivo SEFIP transmitido.
[…]
4.4.5 para fins de fiscalização o empregador mantém em arquivo, pelo prazo legal de 30 anos, uma cópia da GRRF quitada e o(s) respectivos demonstrativo(s) do(s) trabalhador(es).
[…]
8.1.9 os registros constantes nos arquivos magnéticos não necessitam da reprodução concomitante em meio papel, porém, o empregador preserva seus arquivos pelo prazo legal de 30 anos para fins de fiscalização, assim como o protocolo de envio de arquivos gerado pelo conectividade social ICP v2 é o comprovante da transmissão do arquivo SEFIP.
De igual forma, o fgts – manual de orientações – retificação de dados, transferência de contas vinculadas e devolução de valores recolhidos a maior – vigência 30.08.2023 traz a previsão reproduzida abaixo:
3.3.1 a caixa regulariza lançamentos de contas vinculadas de período não atingido pelo prazo prescricional de 30 anos do fgts, a contar da data de realização do lançamento até a data da solicitação de regularização.
Desse modo, percebe-se que, para fins de fiscalização, a caixa ainda reconhece que o prazo prescricional é de 30 anos.
Por fim, isso não impede que o empregador que se sentir prejudicado questione administrativa e judicialmente o prazo adotado pelo auditor fiscal do trabalho (AFT), por exemplo.
6. Resumo
Segue abaixo resumo do prazo prescricional para questionar os valores depositados ou não de fgts, como indicado nesta matéria:
Data de admissão prescrição
Até 13 de novembro de 1989 30 anos (até 13 de novembro de 2019)
Entre 13 de novembro de 1989 e 13 de novembro de 2014 30 anos se a ação for movida até 13 de novembro de 2019
Entre 13 de novembro de 1989 e 13 de novembro de 2014 5 anos se ação for movida após 13 de novembro de 2019
Após 13 de novembro de 2014 5 anos
Salienta-se que esses prazos acima são para análise da cobrança dos valores de fgts devidos durante o curso do contrato de trabalho, mas o trabalhador ainda possui o prazo de dois anos para entrar com a ação após o término do contrato de trabalho (súmula 362 do TST, artigo 11 da CLT e artigo 7°, inciso XXIX da CF/88).