Possibilidade De Distribuição De Lucros Da Conta De Reserva De Subvenção

05/12/2023

Existe hoje uma grande discussão sobre o tema subvenção. Por conta da possibilidade da exclusão dos valores apurados sobre esta rubrica das bases de cálculo do pis/cofins e em especial do irpj e cssl.

Isso porque o Superior Tribunal de Justiça, considerando expressamente as inovações legislativas introduzidas pela lei 12.973/14 e alterações da LC nº 160/2017, entendeu pela exclusão incondicionada dos créditos presumidos de icms da base de cálculo do irpj e da csll, não fazendo, a este respeito, qualquer tipo de limitação. A propósito, veja-se o seguinte precedente:

Recurso interposto na vigência do CPC/1973. Enunciado Administrativo nº 2. Processual civil. Tributário. Violação ao art. 535, CPC/1973. Alegações genéricas. Súmula n. 284/STF. Exclusão dos créditos presumidos de icms da base de cálculo do imposto de renda da pessoa jurídica – irpj e da contribuição social sobre o lucro líquido – csll. Irrelevância da classificação como “subvenção para custeio” ou “subvenção para investimento” frente aos ERESP. N. 1.517.492/pr. Consequente irrelevância dos arts. 9º e 10 da lc n. 160/2017 e §§ 4ºe 5º do art. 30, da lei n. 12.973/2014 para o desfecho da causa.

O fisco federal sempre caracterizou as subvenções em duas espécies: subvenção de custeio e subvenção de investimento.

O Regulamento do Imposto de Renda Decreto 3.000/99, atual Decreto 9.580/18 assim dispõe:

“art. 392. Serão computadas na determinação do lucro operacional:

I – as subvenções correntes para custeio ou operações, recebidas de pessoas jurídicas de direito público ou privado, ou de pessoas naturais (lei nº 4.506, de 1964, art. 44, inciso IV);

(…)”

“art. 443. Não serão computadas na determinação do lucro real as subvenções para investimento, inclusive mediante isenção ou redução de impostas concedidas como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos, e as doações, feitas pelo poder público, desde que (decreto-lei nº 1.598, de 1977, art. 38, §2º, e decreto-lei nº 1.730, de 1979, art.1º, inciso VIII):

I – registradas como reserva de capital que somente poderá ser utilizada para absorver prejuízos ou ser incorporada ao capital social, observado o disposto no art. 545 e seus parágrafos; ou

Ii – feitas em cumprimento de obrigação de garantir a exatidão do balanço do contribuinte e utilizadas para absorver superveniências passivas ou insuficiências ativas.”

Vejamos as distinções entre as duas porque as subvenções tratadas na legislação fiscal diferem quanto aos conceitos e à origem das transferências.

Enquanto nas subvenções correntes (integrantes do lucro operacional) os recursos são recebidos de pessoa jurídica de direito público ou privado, ou de pessoas naturais, nas subvenções isentas (para investimento) sua origem deve ser o poder público. Desta forma, se os recursos forem oriundos de entidades privadas, ainda que destinados a investimentos, serão computadas na determinação do lucro operacional. Este conceito decorre da alteração introduzida pelo decreto-lei nº 1.730/79 que se distanciou da generalidade contida na lei das sociedades por ações.

Assim, como condição para a não tributação, as pessoas jurídicas que obtiverem subvenções para investimento do poder público deveriam creditá-las à reserva de capital. Com a revogação da alínea “d‟ do §1º do art. 182 da lei nº 6.404/76, as subvenções governamentais não podem ser creditadas diretamente ao patrimônio líquido. Serão reconhecidas como receita ao longo do período necessário para confrontar com as despesas que a subvenção pretende compensar. A novidade fica por conta da equiparação à subvenção dos benefícios fiscais da isenção ou redução de impostos concedidos como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos.

Por oportuno, trazemos à colação os comentários de Noé Winkler ao art. 443 do RIR/99, que trata das subvenções para investimento e doações:

“com esse entendimento não concorda o respeitado tributarista josé Luiz Bulhões Pedreira (“imposto sobre a renda – pessoa jurídica ‟, vol. II, pg. 618), ao contrariar as conclusões do parecer normativo 114/78, que seguiu a mesma abordagem dos PN 112 e 113/78. Afirma em sua obra que „as disposições diversas do artigo 38 (do decreto-lei nº 1.598/77), embora localizadas em subdivisão da seção sobre resultados não operacionais, não regulam modalidade desses resultados, mas excluem do lucro real transferências de capital. O decreto-lei nº 1.598/77 – prossegue – teria sido mais esquemático se, ao lado das seções sobre lucro operacional e resultado não operacionais, tivesse aberto nova seção, sobre transferências de capital – que não são nem lucro operacional nem resultados operacionais, porque não são renda ‟. E conclui: “o fato de ter agrupado essas disposições no final da seção relativa aos resultados não operacionais não é suficiente para autorizar conclusão incompatível com o texto das normas contidas no artigo 38″DL 1.598/77).

O art. 545 trata da vedação da distribuição aos sócios do valor do imposto que deixou de ser pago em virtude de isenções ou reduções do imposto como incentivo ao desenvolvimento regional.

Da mesma forma o art. 30 da lei 12.973/14 veda a distribuição de lucros quando houver resultado de subvenção para investimentos.

Observe que o texto é claro ao restringir apenas as subvenções de investimento, deixando ao largo as subvenções de custeio.

É certo a existência de duas espécies de subvenção. Uma condicionada (investimento) e outra incondicionada (custeio). Da mesma forma é fácil identificá-las. A primeira situa-se nas condições que os estados cobram uma contrapartida para o uso dos benefícios concedidos. Já as subvenções incondicionadas não exigem contrapartida e são representadas por isenções e créditos presumido entre outras.

Ora, os conceitos não podem ser modificados ou alterados para atingir efeitos tributários, EX VI do art. 109 do CTN.

Portanto a classificação contábil deve seguir o seu conceito e considerar sua essência.

Com o advento da lei 11.638/2007, com a convergência da contabilidade nacional com a estrangeira, surgiram os pronunciamentos do CPC – comitê de pronunciamentos contábeis – que balizam as normas técnicas aplicadas no brasil, pelos órgãos reguladores das atividades controladas – Banco Central, CVM, ANS, entre outros – e da profissão do contabilista, Conselho Federal de Contabilidade. Esses pronunciamentos alteraram, em parte, o entendimento dos registros contábeis de incentivos e benefícios fiscais.

Os CPCs são positivados no Brasil, nas atividades não regulamentadas, pelas resoluções do CFC – Conselho Federal de Contabilidade e nas regulamentadas, quando aprovados pelos respectivos órgãos reguladores, na estrita observância do princípio de que norma especial revoga a geral.

A estrutura conceitual básica, aprovada pela resolução CFC n.º 1.374/11, é adotada por todos os órgãos reguladores, pois definem conceitos intrínsecos da ciência contábil, aplicáveis a todos os patrimônios e entidades. Dentre eles, encontra-se o pressuposto da essência sobre a forma: o reconhecimento da alteração patrimonial deve ser registado conforme a essência da operação, independentemente de sua forma.

Os elementos diretamente relacionados com a mensuração da posição patrimonial e financeira são os ativos, os passivos e o patrimônio líquido. Estes são definidos como segue:

(a) ativo é um recurso controlado pela entidade como resultado de eventos passados e do qual se espera que fluam futuros benefícios econômicos para a entidade;

(b) passivo é uma obrigação presente da entidade, derivada de eventos passados, cuja liquidação se espera que resulte na saída de recursos da entidade capazes de gerar benefícios econômicos;

(c) patrimônio líquido é o interesse residual nos ativos da entidade depois de deduzidos todos os seus passivos.

Ao avaliar se um item se enquadra na definição de ativo, passivo ou patrimônio líquido, deve-se atentar para a sua essência subjacente e realidade econômica e não apenas para sua forma legal.

Os elementos de receitas e despesas são definidos como segue:

(a) receitas são aumentos nos benefícios econômicos durante o período contábil sob a forma de entrada de recursos ou aumento de ativos ou diminuição de passivos, que resultem em aumento do patrimônio líquido e que não sejam provenientes de aporte dos proprietários da entidade; e

(b) despesas são decréscimos nos benefícios econômicos durante o período contábil sob a forma de saída de recursos ou redução de ativos ou incremento em passivos, que resultem em decréscimo do patrimônio líquido.

Assim, quando a operação não altera o patrimônio líquido, não é receita nem despesa, mas o que se chama de operação permutativa.

O icms é um tributo incidente sobre as vendas, incluso no valor das notas fiscais e – por questões de controle de arrecadação, muito mais do que característica contábil – integra o valor do que se chama receita bruta, nos termos do art. 187, da lei 6.404/1976, primeiro item da demonstração de resultados.

Como, na sua essência, não pertence à entidade, mas a unidade federada, não aumenta nem diminui o patrimônio líquido, muito embora integre a receita operacional bruta daquela.

Para eliminar da receita os efeitos de impostos embutidos no faturamento, as disposições legais, determinam sua apresentação na demonstração de resultados, como redutora da receita bruta, para apurar a líquida, essa sim, proveniente e pertencente exclusivamente das operações da entidade.

Embora a distinção entre as duas subvenções sejam claras sendo uma de investimento e outra de custeio, ambas são originarias de leis emitidas pelos estados, representando renúncia fiscal destes.

Pelo entendimento do superior tribunal de justiça independentemente da espécie de subvenção e sua classificação fiscal, ambas não podem ser tributadas pelo governo federal sob pena de ferir o pacto federativo.

A irrelevância da classificação contábil do crédito presumido de icms posteriormente dada ex lege pelos §§ 4º e 5º do art. 30, da lei n. 12.973/2014 em relação ao precedente deste superior tribunal de justiça julgado nos eresp 1.517.492/pr já foi analisada por diversas vezes na primeira seção, tendo concluído pela ausência de reflexos.

Seguem os múltiplos precedentes: AGINT NOS ERESP. N. 1.671.907/RS, AGINT NOS ERESP. N. 1.462.237/SC, AGINT NOS ERESP. N. 1.572.108/SC, AGINT NOS ERESP. N. 1.402.204/SC, AGINT NOS ERESP. N. 1.528.920/SC, PRIMEIRA SEÇÃO, REL. MIN. GURGEL DEFARIA, TODOS JULGADOS EM 27.02.2019; AGINT NOS EARESP. N.623.967/PR, AGINT NOS EDV NOS ERESP. N. 1.400.947/RS, AGINT NOS EDVNOS ERESP. N. 1.577.690/SC, AGINT NOS ERESP. N. 1.585.670/RS, AGINTNOS ERESP. N. 1.606.998/SC, AGINT NOS EDV NOS ERESP. N.1.627.291/SC, AGINT NOS ERESP. N. 1.658.096/RS, AGINT NOS EDV NOS ERESP. N. 1.658.715/RS, PRIMEIRA SEÇÃO, REL. MIN. ASSUSETE MAGALHÃES, TODOS JULGADOS EM 12.06.2019.

Portanto para fins fiscais não há incidência de tributos federais das rubricas subvenção, sejam elas de investimento ou custeio, tendo em vista o pacto federativo.

Porém, isso não altera a classificação contábil, que deve considerar a subvenção de custeio redutora de resultado sendo seu saldo controlado, para efeitos fiscais, no LALUR.

Como conceito claro de subvenção de custeio não integra o conceito de subvenção de investimento, motivo pelo qual não há subsunção do artigo 30. Da lei 12.973/14 que proíbe a distribuição de lucros aos sócios.

Ora, é lógico que não há como distribuir lucros sobre uma subvenção que é condicionada a aplicação de investimentos, sob pena de desvirtuar sua finalidade.

Ao contrário a subvenção de custeio, tem por objetivo fomentar a atividade empresarial, para que a mesma possa existir e ter lucro. Logo o valor da rubrica subvenção se integra ao patrimônio da atividade empresarial, e a partir deste momento pode seu sócio usar e gozar do bem patrimônio e decidir o seu destino. Ou pelo contrário teremos um saldo de conta de reserva de subvenção “ad eternum”.

O direito existe dentro de uma estrutura lógica normativa, e seus conceito são determinantes para definir o fato gerador e suas obrigações.

Portanto não existe lógica em proibir a distribuição de lucros de uma conta de reserva de subvenção incondicionada, pois seu uso deve ser livre para seu administrador definir o seu futuro.

Desta forma, entende-se que não pode haver proibição da distribuição de lucros da conta de reserva de subvenção de custeio (crédito presumido).